Importante é preservar a memória dos lugares. OLHÃO é a minha Cidade.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

A Igreja Pequena (II)


A Capela da Nossa Senhora do Rosário - A Igreja Pequena



Localizada no limite Norte da aldeia de pescadores de Olhão no século XVII, com a fachada principal voltada a Sul, para a localidade, a actual capela de Nossa Senhora da Soledade foi a primeira igreja matriz da povoação. A sua construção remonta à primeira metade de Seiscentos, altura em que Olhão despontava já como pólo proto-urbano a nascente de Faro, graças à sua activa e florescente comunidade piscatória.

De planta longitudinal composta por nave única e capela-mor quadrangular (esta coberta por uma cúpula oitavada), a igreja é uma obra barroca relativamente modesta, mas que denota alguma riqueza artística de âmbito regional, como a existência de uma cúpula (elemento que procurou alcançar alguma da monumentalidade cenográfica que caracteriza o período barroco). A fachada principal acentua a relativa simplicidade do projecto, ao organizar-se num corpo único de três andares, onde se inscreve um portal de arco recto e um grande janelão vertical, terminando em empena triangular irregular, cujo tímpano é decorado por um brasão sobrepujado por cruz. No interior, o espaço é amplamente iluminado por três pontos focais: lateralmente (por janelões na parede Norte da nave); verticalmente (através do lanternim da cúpula) e longitudinalmente (pelo grande janelão da fachada principal).

A autonomia concelhia dos olhaneses, conseguida em 1695, levou à construção de um templo de maiores proporções e de outro impacto urbanístico e cenográfico. No mesmo século em que havia sido construída, a primitiva matriz deixava de corresponder à imagem de poder e de autonomia de uma população em ascendência. Em 1715, o novo tempo tutelar da paróquia abria ao culto e transferiam-se, solenemente, os sinos da antiga matriz para a recém inaugurada igreja. Com esta mudança, a Soledade passava à condição de capela, utilizada para funções essencialmente devocionais e funerárias, como ainda hoje acontece.

Altar-mor


Todavia, a transferência da sede religiosa não significou uma menor atenção por parte da comunidade de Olhão em relação ao seu primeiro templo. Se, em 1734, há a notícia de que uma parede se encontrava muito arruinada, não deixa de ser verdade que, meio século depois, houve recursos económicos suficientes para a feitura de um novo retábulo-mor. Este, foi contratado pelo Compromisso Marítimo, a 18 de Maio de 1779, com o entalhador farense Manuel Francisco Xavier, "o mais prestigiado entalhador algarvio no período rococó" (LAMEIRA, 2000, p.326) e, certamente, um dos mais caros artistas da época (na altura já em fim de carreira), facto que comprova o relativo desafogo económico da confraria dos marítimos de Olhão.

Com a actualização estética do ponto fundamental de religiosidade do interior da igreja, fechava-se um capítulo na história do templo. Depois dessa grande empreitada, só chegaram referências de obras menores de consolidação e de conservação dos elementos já existentes, como terá acontecido em 1855. Na actualidade, a função de apoio à igreja matriz, servindo de capela mortuária, é a principal função deste templo. Em todo o caso, mantém-se como um dos imóveis mais emblemáticos da cidade, não apenas pela componente de memória que encerra, mas, também, pela sua localização privilegiada, nas traseiras do Compromisso Marítimo (actual museu) e no mesmo conjunto urbano que a Igreja Matriz.

Direcção-geral do Património Cultural

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

O Contra-Mundo




Mapa de Olhão de 1875, onde está assinalada a Cerca do Júdice

O salto demográfico originado pela instalação da indústria conserveira traduziu-se num aumento significativo de construções habitacionais no início do século XX e impôs um alargamento da área urbana da Vila de Olhão.

 Assim, por Decreto de 19 de Julho de 1901, confirmado depois por Provisão Régia de 11 de Agosto de 1902, foram, então, definidos novos limites geográficos para a Freguesia de Nossa Senhora do Rosário, ou Freguesia de Olhão: a Norte, a estrada real n.º 78 (atualmente a Estrada Nacional n.º 125); a Nascente, o caminho chamado dos Moinhos, (ficava a Este do Bairro da Cavalinha); e a Poente, o ribeiro do Charco (que corria na direção da dita estrada real e terminava nas salinas, a Sul). 
 
Fotografia aérea, provavelmente da segunda década do século XX. Atente-se no lado esquerdo da fotografia, onde está localizado o cemitério municipal


A construção da linha de caminho de ferro em 1903 fez surgir uma pequena ponte entre a rua 18 de Junho e o Alto do Pau Bolado, onde estava instalado o Cemitério Municipal, e permitiu a continuação do caminho que bordejava a antiga Cerca do Júdice até à estrada real nº 78. 

Ligação entre a Rua 18 de Junho e o Cemitério Municipal - anos 40

Nas duas décadas seguintes surgiram novas construções habitacionais e industriais nas novas áreas resultantes do alargamento. 
E o chamado Contra Mundo nasceu aqui: entre o segundo troço da Rua 18 de Junho e o último troço da Rua Almirante Reis, e continuando para além da linha férrea, ocupando o que restava da antiga Cerca do Júdice.



Rua Almirante Reis, na primeira década do século XX, continuando para lá da linha do caminho de ferro


 
Rua do Caminho de Ferro, provavelmente da mesma data da anterior

O traçado urbano compreendia seis ruas, sendo a primeira rua a que ainda hoje se chama Rua dos Caminhos de Ferro e a última exactamente a Rua constituída pela estrada nacional (limite da Freguesia), com uma rua transversal que iniciava na segunda rua e terminava na dita estrada nacional.


Fotografia aérea dos anos 30/40. Ao centro a nova área urbana. Legendagem da autoria do Sr. António Martins

As casas, mais espaçosas e adornadas, refletiam o investimento dos proventos angariados pelos seus proprietários, emigrantes ou ex-emigrantes em terras do continente americano, nomeadamente do Brasil, Argentina e Estados Unidos.



Fazem parte do Contra-Mundo as Ruas:

Rua do Caminho de Ferro
 
Rua Manuel de Oliveira Nobre

 
Rua Joaquim Ribeiro

Rua Gago Coutinho
Rua Sacadura Cabral
Rua Joaquim do Ó
Rua Manuel Martins Garrocho
Rua Cerca do Júdice


Traçado urbano do Contra-Mundo


Fontes:
Sandra Romba, Evolução Urbana de Olhão
Antero Nobre, Breve História de Olhão
Arquivo Municipal Rosa Mendes, Olhão
Toponímia, fotografias arquivo pessoal