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sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

A Igreja Pequena - Fundação

A Igreja Pequena



 A 1 de fevereiro de 1956, Abílio Gouveia publicou no "Correio Olhanense" este artigo sobre a Igreja da Soledade:

A Igreja da Soledade quando foi fundada?


"Das raras coisas locais que ainda permanecem envoltas em mistério uma delas é a data da fundação da Igreja da Soledade.
Nada de positivo se conseguiu ainda apurar, acerca deste templo, no que respeita à época da sua construção. Que ele é o mais antigo de Olhão, isso não sofre qualquer dúvida, bastando a indicação expressa na lápide existente na Igreja matriz, para disso nos certificarmos.
O pouco que se sabe de Olhão de antanho, leva-nos a supor que a ermida da Soledade teria sido fun­dada no tempo em que o núcleo populacional local era, na maioria, constituído por gente do campo, antes, portanto, da fixação, na sua praia, dos pescadores construtores das cabanas de junco e da Igreja matriz. Daí, as designações de poço de Olhão e praia de Olhão, para distinguir os sítios onde residiam os camponeses e os marítimos.
Vêm corroborar aquela nossa as­serção, os nomes das imagens que se veneram na ermida, todos eles, com excepção do Senhor dos Passos, que veio da outra igreja, de carácter puramente campesino.

Altar de São Sebastião,
(256 d.C. – 286 d.C.), mártir e santo cristão, morto durante a perseguição
 levada a cabo pelo imperador romano Diocleciano.

Mais tarde, a ermida teria ser­vido, comunmente, a terrestres e marítimos e estes, cada vez mais numerosos, quiseram ter um templo seu, erigindo, nos princípios do sé­culo XVIII. a actual igreja de Nos­sa Senhora do Rosário.
Somente por curiosidade, vamos referir-nos a uma notícia que tal­vez tenha ligação com o assunto que estava a tratar:
Ataíde Oliveira, escreveu em 1913, para um número especial do jornal «A Mocidade», de Faro, um artigo sobre Marim, no qual, a par de coisas que devem ter visos de verdade, encontra-se muita fantasia à mistura.
No citado artigo, vêm certas refe­rências a uma capela de Nossa Se­nhora da Soledade, que teria sido fundada em terras de Marim por uma senhora, irmã do cavaleiro Martin Enes, de Lagos, casada com Afonso Madeira, senhor dos domínios de Marim, no tempo em que reinava em Portugal, D. João I.
Ora, Olhão desse tempo, fazia parte das terras de Marim, e, como não se conhece nenhuma igreja ou seus restos, com essa designação, nos nossos arredores, não seria a dita capela a nossa actual ermida da Soledade, que, depois do primi­tivo nome, passou a ser designada pelo de Nossa Senhora do Rosário e mais tarde, com a construção do novo templo, voltou a manter a sua antiga denominação?
A hipótese é um tanto ousada, mas à falta de melhor, por carência de elementos para o fazer ela pode ficar de pé  até prova em contrário.
Tem também de se ter em conta que a contextura actual da ermida da Soledade, não é a primitiva. O templo deveria ter sofrido grandes estragos com o terramoto de 1795 e daí, na sua reparação, o não ter sido conservada a primitiva arqui­tectura profundamente modificada com a realização das obras feitas ao sabor do tempo.


Cúpula por cima do presbitério


Coro, por cima da porta principal
A ser assim, teríamos que remon­tar aos fins do século XIV a funda­ção da ermida, isto é, pouco mais de três séculos antes de ter sido construída a igreja de Nossa Se­nhora do Rosário.
A ermida da Soledade possuía um pequeno cemitério anexo, si­tuado na parte que dá para a actual rua do Compromisso, no local onde hoje existe uma dependência que serve de arrecadação do templo. Esse cemitério funcionou até mea­dos do século XIX, altura em que foi construído o cemitério munici­pal, sendo trasladados para lá todos os despojos fúnebres, tanto os da­quele cemitério, como os existentes no largo da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, que ao tempo estava coberto de sepulturas.
No interior da ermida existem ainda três lápides sepulcrais, remon­tando a mais antiga delas ao ano de 1810.
A primeira lápide encontra-se em frente ao altar-mor.
A sua inscrição é: S. de José Quintino Dias, 1-3-1810.
A segunda, está junto ao altar de Santa Clara e reza: Aqui jaz Cathrªdo Esptº Stº faleceu a 4 Abril de 1851.

 
Altar de Santa Clara, com seguinte inscrição: Clara! Consolação da Igreja Glória de Itália  Remédio dos Povos e Admiração do Mundo Cathólico


 A terceira encontra-se junto da porta da sacristia, que deita para a nave e diz o seguinte: aqui jaz. o estudante João Rosendo Júnior que faleceu em 2 de Outubro de 1851.

Lápide do estudante Rosendo

 Num testamento de que temos conhecimento, feito em 1833 no ta­belião Miguel Elesbão Monteiro, os testadores Fernando dos Santos e Teresa de Jesus «Fogueteira», ma­rido e mulher resolveram escolher, para sua última morada, a Igreja da Soledade.
O referido documento é muito curioso, pela expressão das últimas vontades dos dois esposos.
Assim, em recompensa dos seus corpos serem sepultados na dita igreja, foi esta contemplada, por ca­da um deles, com a esmola de mil e duzentos réis, além de dois anéis de ouro, oferecidos à Senhora da Boa Morte da capela das almas, que está na igreja matriz, «para que lhe dêm boa morte e os livre dos seus capitais inimigos».
E, «para descargo das suas cons­ciências e para que limpos de cora­ção pudessem ir gozar a Eterna Glória para que Deus os criou», pe­diam para que fossem ditas por alma deles, dos avós, pais, tios e tias, primos e primas e ao anjo da guarda e santo e santa de seus no­mes, e pelas almas do purgatório, etc. etc, nada menos do que um total de 700 (!) missas, ao custo de duzentos réis cada uma.
E, «se ainda lhes ficarem alguns bens, sendo estes de cem mil réis, lhe dirão a confraria de Nossa Se­nhora da Soledade, perpetuamente 25 missas e se mais serão as missas que a dita confraria será obrigada a dizer-lhes todos os anos».
O casal, que não tinha filhos, deixou a cada um dos seus irmãos a quantia de oitocentos réis, mas, como estes lhe deviam importância superior, ser-lhes-iam perdoadas as dívidas com a obrigação de não re­ceberem nada da herança.
Foi mais feliz a irmã da testa­dora, Antónia da Conceição, que herdou da sua mana, um capote e uma saia.
E foi tudo quanto conseguimos apurar sobre   nossa  igreja da Soledade.

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